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sábado, 30 de novembro de 2013

UMA BREVE VIAGEM AO LONGO DO AMOR


 Francisca gostava imenso de estender o seu corpo ao longo do sofá e deitar a cabeça no colo de Fernando. Nem sequer precisava pedir-lhe, pois ele conhecia perfeitamente aquele jeito manhoso da mulher e, acto contínuo, estendia as mãos para a sua cabeleira à mercê das carícias e, com as unhas, traçava-lhe carreiros entre os cabelos, alisando-lhe a pele, num afago tão sensível e de prazer tão profundo, que ambos se arrepiavam com o poder inebriante de um simples gesto de ternura.
- As tuas mãos são uma delícia meu amor. Nunca deixes de me pentear com carícias - dizia-lhe ela.
- Nunca deixarei de o fazer. Os teus cabelos são tão macios e leves que poderei ficar aqui toda a vida, sem me cansar, de olhos fechados, a imaginar que penteio ervas ou aliso areia, com a polpa sensível dos dedos tacteando a emoção.
Eles não eram piegas, hipócritas, fingidos ou banais. Apenas se amavam. Somente diziam o que sentiam. E a verdade contém toda a razão. Não há nada de mais puro e emocional do que a sinceridade.
Já tinham comemorado as bodas de prata. Caminhavam para os cinquenta anos e o seu espírito, a sua atracção e o seu Amor eram, sem sombra de dúvida, na sua juventude e frescura, o mesmo daqueles jovens que há cerca de trinta anos, num simples fogo-de-vista, se apaixonaram no interior de um comboio Regional que fazia a viagem entre Lisboa e o Entroncamento.
Fernando lembra-se perfeitamente daquele dia no final de um mês de Outubro ainda quente. Do vestido de meia manga e comprido que caía um pouco acima dos tornozelos de Francisca, plantado de flores amarelas, lilases e vermelhas, com os quatro botões azuis do peitilho abertos, deixando antever a pele branca e sensual dos seios. Recorda-se exactamente do rosto dela, simples, tranquilo e bonito de camponesa, a sobressair do tecido daquele campo de pétalas, sem um assomo de pintura, apenas com um tom levemente bronzeado, protegido por uma longa esteva de cabelos escuros.
Como é que poderia ter ficado indiferente à aparição daquela mulher? Era um jovem. Só de olhá-la, a sua cabeça mergulhou de pronto na ilusão. O seu sexo distendeu-se ante a imaginação daquele corpo nu e de poder tocá-lo suavemente, como quem contempla um sonho e tem medo que ao acordar ele se desvaneça de repente, para sempre.
Francisca também jamais se esqueceu do jovem alto. De jeans justos, moldando umas pernas fortes e perfeitas. Da t-shirt vermelha vincando o poder dos seus peitorais. Dos braços musculados e cabeludos inspirando-lhe o desejo do toque. Do desejo de afagar o seu rosto por barbear e desmanchar os caracóis do seu cabelo espesso e amarelo como palha.
Naquele tempo já distante no passado, nem no trilho mais profundo dos seus sentidos eles imaginavam que davam início à mais longa, bela e infinita viagem na carruagem do AMOR.



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